No último dia 18 de abril foi lançada a 20ª carta anual do acionista da Amazon.com, Inc. Conforme preza a tradição, todos os anos o seu CEO, Jeff Bezos, escreve uma carta reforçando os principais valores da companhia, bem como enaltece as conquistas atingidas no ano que passou.

Para quem acompanha o mercado das Big Techs, as cartas de Bezos são excelentes manuais de como entender a cultura desta “nova economia”. Tomo a liberdade de dizer que se assemelham às cartas de Warren Buffet com uma roupagem mais silicon valley.

Vamos à carta deste ano.

Em busca do mais alto padrão

Bezos inicia sua carta de 2018 deixando bem claro quais são os princípios que seus mais de 560.000 Amazonians (como ele apelida os funcionários da Amazon) prezam no trabalho todos os dias: implacável obsessão com o cliente, uma dose de ingenuidade e compromisso com a excelência operacional.

Falando em obsessão com o cliente, Bezos nos revela aquilo que ele mais ama sobre seus clientes: eles são divinamente descontentes. As expectativas dos clientes nunca são estáticas, estes possuem um apetite insaciável pelo melhor produto/serviço, o autor deixa claro que o “uau” de ontem rapidamente se torna a normalidade de hoje.

De acordo com o CEO, está ocorrendo um ciclo de melhoramento global dos serviços mais veloz que qualquer outro momento da humanidade. O principal motivo: maior acesso à informação e, com alguns toques nos seus smartphones, consumidores podem ler avaliações de produtos, comparar preços de múltiplos varejistas, ver se há produto em estoque, compara prazos de entrega, e muito mais.

Sabendo que os clientes são a obsessão de sua empresa e que eles nunca estão satisfeitos, Bezos nos questiona: como se manter a frente desta expectativa sempre crescente dos consumidores? Como, enquanto prestador de serviços, a Amazon pode se antecipar a esta onda? 

A resposta: não há uma única maneira de se fazer isto, na verdade se trata de uma combinação de vários fatores.

Mas, na opinião do dono da the everything store, o mais alto padrão é o fator que mais contribui para deixar seus clientes satisfeitos. Uma história de alto padrão da Amazon se construiu com alguns sucessos, mas também com alguns bilhões de dólares gastos em falhas.

Intrínseco ou ensinável?

Um debate interessante aberto por Bezos em sua carta é um antigo dilema a respeito do alto padrão: seria este padrão intrínseco das pessoas e das empresas ou os mesmos seriam capazes de ser ensináveis e replicáveis? 

Bezos acredita que altos padrões são acima de tudo ensináveis. Mais do que isso, pessoas são muito boas em compreender padrões elevados de qualidade pela simples exposição aos mesmos.

O dono da Amazon acredita também que, uma vez que alguém é exposto ao melhor, é algo quase que contagioso, ou seja, este alguém estará sempre em busca do melhor. Lembrando que o oposto também é verdadeiro, uma vez exposto aos piores padrões, estes são dados como normais e também se espalham, só que de uma maneira negativa.

Uma dica de Bezos é que, principalmente em organizações, se deve ensinar e expor uns aos outros a estes padrões elevados, isto ele acredita ter sido o grande acelerador da Amazon nestas duas décadas de história.

Universal ou específico?

O autor também acredita que padrões elevados de qualidade são altamente específicos e que devemos aprender os melhores padrões separadamente em cada área do conhecimento. 

Quando Bezos fundou a Amazon, por exemplo, ele entendeu que sua empresa deveria perpetuar os mais elevados padrões nas seguintes áreas: invenção, cuidado com o cliente e contratação de equipe. E conseguiu cumprir o nível mais alto de excelência em cada uma destas áreas.

Ao mesmo tempo, o CEO percebeu que sua empresa no início deixava a desejar em bons padrões operacionais: como manter resolvidos antigos problemas, eliminar defeitos na causa e não nos sintomas, inspecionar processos, etc. Muitas destas áreas são o que hoje enxergamos como diferenciais da Amazon, mas já estiveram muito longe de um padrão considerado excelente.

Entenda que se trata de um processo dinâmico. Empresas e pessoas podem ser consideradas de altíssimo nível, mas sempre haverá pontos cegos. Por isso, a importância de ser específico no momento de elevar a qualidade de qualquer atividade e focar nas maiores fraquezas de maneira detalhada.

Identificação e escopo

Ok, identificados os pontos a melhorar, os pontos cegos. Agora, o que precisamos fazer para alcançar o mais alto padrão em algum campo ou atividade específica?

De acordo com Bezos, primeiro você deve estar aberto a identificar o que é entendido como “bom” ou “melhor” padrão naquele domínio específico.

Em um segundo momento você deve traçar expectativas realistas do quão difícil será para alcançar seus objetivos, ou seja, quanto esforço e trabalho serão aplicados para se atingir o mais elevado padrão. A isso o autor dá o nome de escopo.

Expectativas surreais na definição do escopo são os principais depressores de qualquer padrão considerado excelente.

Para atingir um padrão elevado como parte de um time, você deve planejar e comunicar sua equipe de maneira proativa qual o verdadeiro padrão que se deseja atingir, bem como reforçar as prováveis dificuldades para se atingir este padrão. Todo processo feito com base em expectativas, acima de tudo realistas.

Benefícios da excelência

Muitos são os benefícios de se construir uma cultura de excelência: melhores produtos e serviços para os clientes, melhores processos internos de recrutamento e retenção de talentos, etc.

A busca pela excelência é a proteção de todo aquele esforço invisível aos olhos de muitos, mas crucial para o bom desenvolvimento das organizações. Executar bem o trabalho já é a recompensa do alto padrão.

Recapitulando: altos padrões são ensináveis, específicos, identificáveis e de escopo realista. Mais do que isso, tudo à excelência é divertido, uma vez que se degusta ser o melhor não há como voltar! 

Estas palavras não são minhas, são apenas do senhor mais rico do mundo.