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O que “o Brasil voltou” significou até agora?

8 de maio de 2023
Escrito por Terraco Econômico
Tempo de leitura: 7 min
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imagem ilustrativa

O fenômeno de posicionar medidas de um governo em comparação ao que se passou no anterior é comum não apenas ao cenário brasileiro como à política como um todo. A dita “herança maldita” do governo passado é página repetida na nossa história.

Mas existe um limite para isso: quando esse ponto se torna o central de toda a gestão. O que pode acontecer é paradoxal ao que se imagina.

E é disso que iremos falar neste artigo.

“Cheguei para livrar o Brasil do socialismo”

Logo no momento de sua chegada ao cargo máximo do Executivo, em seu primeiro discurso, Bolsonaro pontuou que chegava para “mudar radicalmente” tudo que se passava, inclusive citando a frase que agradou muitos apoiadores fervorosos que deu nome a esse subtítulo – como se isso fizesse algum sentido, principalmente levando em conta o cenário que ele pegava, vindo de um Governo Temer que se empenhou fortemente na reversão de rota do que ocorria imediatamente antes.

O posicionamento daquele primeiro discurso poderia parecer simbólico, mas foi muito mais presente em termos de ações executadas em diversos setores do que se imaginava. Desde um ministro do meio ambiente que negava contribuições de redução de desmatamento e queimadas ocorridas em períodos anteriores, passando por ministros da educação que questionavam um certo péssimo método (mas não apresentavam nenhum) e, é claro, a eterna política de balão de ensaio na economia.

Sim, entregas relevantes ocorreram, como a maior e mais robusta reforma da previdência em décadas e diversos marcos legais que destravaram e seguem destravando investimentos importantes em infraestrutura em nosso país.

Mas a pirotecnia de fazer questão de dizer “somos diferentes do que se tinha anteriormente” acabou tomando tanta manchete que, mesmo entre parte dos mais esperançosos de 2018, não fazia sentido continuar com aquele modo de ver as coisas.

E deu no que deu..

Frente ampla(mente concentrada no próprio partido)

Um último ponto relevante e muito colocado na mesa pelo governo anterior seria um suposto meio de evitar corrupção baseado em evitar qualquer tipo de articulação política. A teoria seria evitar o tão falado “toma lá, dá cá” de governos anteriores, mas a prática acabou sendo uma divisão entre dois períodos: um pré pandemia em que se ria do Congresso e se desprezava sua contribuição e em um momento pós pandemia, no qual essa mesma “peça inútil” se tornou central em toda e qualquer decisão – inclusive, é claro, em relação aos rumos orçamentários do país.

Verificando todos os pontos que eram questionados por diversos grupos sobre a atuação do governo anterior, Lula optou por uma estratégia que se assemelhou ao que se passou em 2002: procurar pessoas que discordavam de certo modo do que se passava até então e dizer “juntos iremos fazer diferente de agora em diante”. De maneira muito mais apertada do que o próprio partido atualmente na situação esperava, deu certo, Lula III é uma realidade.

Porém, o que se teve ainda no período de transição decepcionou certas pessoas que participaram do movimento que fez essa realidade acontecer: a frente ampla tão anunciada, pelo visto ficou na campanha. É claro que temos diversos partidos compondo os ministérios e vimos sim uma redução notável nos ruídos entre os poderes, mas na prática o que direciona os esforços por parte do governo é… o próprio partido do governo.

Conceito de base governista é bem diferente hoje

Assim como soluções gerenciais em negócios dependem de cenários e, portanto, precisam mudar conforme as coisas estiverem diferentes, temos também a realidade política. Não faz sentido imaginar que uma situação bastante diversa pode ser resolvida com a mesma mentalidade de “não se preocupe, tenho todas as soluções do mundo”.

A frase tão colocada pelo governo atual e que está no título desse artigo leva em consideração esse salto alto perigoso que já levou a Seleção Brasileira a levar 7×1 em pleno Mineirão. Assume-se como realidade que, mesmo após uma eleição bastante apertada e um Congresso consideravelmente formado por pessoas que discordam da visão de mundo que têm os que levaram o Executivo, automaticamente, por termos o presidente que temos agora, tudo que se passou de positivo anteriormente iria acontecer.

O cenário atual, seja doméstica ou internacionalmente, é bem diferente de vinte anos atrás. E um dos aspectos mais negligenciados em relação a isso é justamente o conceito de base governista.

O governo atual parece ter interpretado de forma equivocada a vitória em uma eleição apertada como se fosse uma demonstração de poder equivalente a ter conquistado um amplo apoio nas urnas. Além disso, eles também parecem ter confundido a distribuição de ministérios entre diversos partidos – embora os mais relevantes e com maior orçamento tenham permanecido sob controle do próprio partido – com a criação automática de uma base sólida e significativa de apoio político.

O resultado prático dessa “confusão” está no que se teve de votação relevante até agora: seja o tal PL das Fake News que sequer se colocou para votação (ainda que disso tenham saído alguns bilhões de reais em emendas parlamentares) ou até mesmo na derrota graúda na Câmara em relação a mudanças que foram colocadas em Medida Provisória sobre o Marco do Saneamento, até então o governo não viu frutos positivos do que supostamente estaria acontecendo (caso sua visão fizesse algum sentido real).

Pautas natimortas, derrotas acachapantes

A grande escolha de Lula III, até o presente momento, está em pegar basicamente todos os pontos colocados por governos não petistas anteriormente – Temer e Bolsonaro – e questioná-los amplamente, tentando revertê-los. E isso é tão amplo quanto querer rever a perda de poder na privatização da Eletrobras ou mesmo retirar restrições relacionadas a indicações em estatais.

O caso específico da Eletrobras chama a atenção por um motivo específico: o meio de se tentar fazer isso não levará em conta o Congresso, mas sim o STF. Esse ponto notável importa porque, historicamente, governos ainda em seus primeiros três ou quatro trimestres costumam ter certa influência positiva em relação às pautas que colocam para votação. Não finalizamos nem o segundo trimestre de Lula III e a sensação é de que os questionamentos sobre tudo que supostamente “destruiu o Brasil” sequer têm amparo nas casas de leis.

Para piorar o cenário, outro ponto questionável sobre os rumos de Lula III envolve o fato de que, mesmo diante de uma época em que o diagnóstico do que deveria ser feito em diversos setores está bastante colocado, o foco parece ser o de trocar a placa de “fizemos isso” de basicamente tudo que não tiver sido colocado em prática por governos petistas.

Dá tempo de reverter essa rota?

Sim, porém os custos aumentam a cada dia que se coloca em questionamento qualquer tópico que tenha sido apresentado por governos anteriores que de fato tenham trazido melhores perspectivas.

Importante notar que, sim, haviam pontos relevantes a serem alterados, como por exemplo o descaso com a área da saúde, questões ambientais e até mesmo de segurança alimentar em termos de fiscalizações realizadas pelo Ministério da Agricultura. Isso não precisaria significar que tudo, absolutamente tudo, demandaria alterações urgentes.

Inclusive, outro ponto notável: existem pessoas na economia que de fato focam mais em planos do que em anúncios pirotécnicos e isso também é bastante positivo.

O custo de não acordar para essa realidade será bastante claro e direto: o governo, se não focar no que quer entregar (e parar de passar o tempo todo dizendo simplesmente que é “diferente do que se tinha antes”), irá se tornar irrelevante em suas pautas propostas.

Não se trata de se curvar a interesses de grupos concentrados de poder, mas de compreender como cenários diferentes deveriam significar abordagens mais eficientes. Talvez ainda dê tempo de mudar, mas é preciso que o atual governo seja rápido e pragmático – como sinalizou que seria durante o período de campanha ou como acredita que faz quando diz que “o Brasil voltou”.

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