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Cabo de guerra no PIB: surpresas micro vs governo criativo

5 de junho de 2023
Escrito por Terraco Econômico
Tempo de leitura: 4 min
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Todos nós economistas estamos há basicamente um ano e meio errando as previsões do PIB. 

No ano passado o motivo era “em anos eleitorais, principalmente os mais polarizados, tudo fica em compasso de espera”: de uma previsões iniciais que iam de recessão a crescimento de no máximo 1%, fechamos acima de 3%. 

Já neste ano, a visão sobre juros altos sem previsão de ceder e governo se equivocando serviria para derrubar as previsões e, até o presente momento, o contrário ocorre.

Neste artigo iremos discutir sobre os dois lados que puxam as previsões para o crescimento econômico atual e tornam o campo das previsões ainda mais complicado do que já é.

O copo cheio: crescimento não captado

Como já discutido nesta coluna de maneira detalhada, nenhuma reforma per se entrega crescimento imediato, mas todas elas, quando bem alinhadas com o que torna o ambiente de negócios mais amistoso, servem para um pavimentar mais adequado do futuro.

É importante relembrar desse fato em basicamente dois momentos: quando uma reforma é aprovada e quando, alguns anos depois, as pessoas começam a se surpreender com os benefícios de algo que basicamente nem se lembraram mais que havia acontecido.

Desde o impeachment de Dilma e a entrada de Temer, uma sequência razoável de reformas econômicas foi colocada em prática: flexibilização trabalhista, marcos legais de investimentos e normalização de diversos setores. De início houve uma cobrança de diversos setores: onde estariam os resultados dessas reformas? Com alguns anos, começamos a ver esses efeitos sobre a resiliência econômica.

As previsões sobre a economia costumam levar em conta mais pontos relacionados à macro do que à microeconomia. Os grandes números agregados como os vindos das contas públicas, o custo dos juros e perspectiva futura para alta ou queda deles, a inflação: tudo isso costuma passar pelo crivo de modelos de diversas instituições que tentam estimar o futuro dos rumos econômicos.

O que acaba ficando de fora são os dois aspectos mais complexos de serem analisados: a produtividade dos fatores na economia e também o ambiente de negócios e como este incentiva ou desaquece novas ideias.

Uma das proxies utilizadas para analisar isso é a participação no PIB que temos de investimentos em agregado dos públicos e privados. Essa relação, nos últimos anos, saiu das proximidades de 15% para atualmente estar em torno de 20%. Na prática, mesmo com tantos efeitos difusos e espalhados, isso significa que a capacidade de crescimento da economia brasileira de fato aumentou.

O lado vazio do copo: crescimento surpreende, mas isolado

Observando com cuidado os dados mais recentes do PIB que surpreendeu para cima no primeiro trimestre de 2023, um dado bastante direto aparece: o que puxou esse crescimento surpresa foi o setor agro, que apresentou crescimento impressionante de 21% apenas neste trimestre. Serviços e indústria, que são os outros dois setores que compõem o lado da oferta do PIB, mostraram dificuldades e andaram de lado.

Pelo lado da demanda, também não temos boas notícias: os juros estão desaquecendo o consumo e a renda, mesmo que melhorando ligeiramente, não tem servido para fazer com que esse consumo fique resiliente.

Em bom português, o que o PIB do primeiro trimestre de 2023 traz é um resultado atípico e surpreendente em termos de safras agrícolas e extração mineral, mas o resto dos setores não apresenta o mesmo ritmo positivo.

Outro aspecto importante a ser observado é que esse crescimento surreal de 21% é o maior em algumas décadas e, na prática, não deverá se repetir tão cedo. 

Sim, é excelente que tenhamos safras recordes e neste ano em diversas culturas isso deve ocorrer, mas não podemos nos iludir sobre uma mágica capacidade infinita de crescimentos sequenciais dessa mesma magnitude.

E o que o governo tem a ver com isso?

Os temores em relação ao governo são divididos em dois aspectos quando o assunto é um PIB que surpreende para cima: em primeiro lugar, o receio é de que as receitas extraordinariamente positivas que costumam vir junto disso deverão ser comprometidas com despesas sustentadas (um equívoco que todos os governos costumam cometer); e, em segundo lugar, há sempre o receio de que velhas ideias sejam retomadas para acelerar a coisa ainda mais, como se existisse um suposto moto-perpétuo de crescimento.

Nesse caso, a proxy é o recente programa de incentivo à compra de veículos novos, que já pode aos poucos se transformar na reedição de outro programa que incentivava a compra de novos caminhões e, se a sequência de ideias criativas do passado seguir adiante, não podemos descartar que algum programa de incentivo à compra de eletrodomésticos da linha branca (geladeiras, fogões e afins) também volte para a mesa.

O maior problema nesse tipo de ideia é a explosiva combinação de incentivo à demanda via perda de arrecadação que pode, ao mesmo tempo, implicar em inflação fora de hora e a necessidade de manutenção de juros em patamar elevado por mais tempo.

Seguiremos acompanhando os próximos capítulos dessa história. Aparentemente os fatores que surpreendem positivamente o PIB estão fortes demais para serem desconsiderados ou simplesmente desmantelados, mas em se tratando do Brasil, jamais podemos duvidar da capacidade criativa de nossos governos de, diante de boas notícias, não resistirem a trazerem novos motivos de lamento e novas cascas de banana para todos nós.

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