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Mercados por TradingView

O que (não) significa a mudança de perspectiva sobre nossa dívida soberana?

19 de junho de 2023
Escrito por Terraco Econômico
Tempo de leitura: 5 min
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Recentemente tivemos uma notícia que animou os mercados no Brasil: pela primeira vez desde 2019, a agência de rating Standard & Poor’s (S&P) sinalizou que espera que a economia brasileira tenha melhoria em sua nota de crédito. 

Provavelmente você já viu em algum lugar sobre o que isso significa, mas neste artigo iremos te apresentar o outro lado.

Não, não se trata de pessimismo que desconsidere o contexto atual – externo e doméstico -, mas sim um apelo ao realismo, aquele que costuma ficar um pouco distante em momentos mais agitados de “Brasil decolando” ou “o Brasil vai acabar”.

Não significa grau de investimento em proximidade

A atual nota de crédito do Brasil foi mantida, seguimos em BB-, o que para essa agência de rating significa que continuamos em grau especulativo. 

A mudança foi de perspectiva, não de nota.

O apontamento dessa diferença se faz necessário porque, unindo ao fato de que a própria Fazenda já apontou recentemente que se alegrou com a notícia e que seguirá trabalhando para buscar o retorno desse grau de investimento durante Lula III, de fato o trabalho necessário para que isso aconteça segue relevante.

Em todo caso, se por um lado o presidente coloca para jogo diversas declarações semanalmente que dão a entender que não há tanto comprometimento com medidas positivas aprovadas em outros tempos, a gestão da economia capitaneada por Haddad de fato pode ser encarada com maior realismo – ainda que ideias vazias (porém custosas) sigam pipocando da altamente criativa mente do líder do Executivo.

Não significa uma entrada maciça de capital estrangeiro agora

As avaliações de rating servem mais como um termômetro a posteriori do que se passa nas situações do que necessariamente de um adiantamento do que deve acontecer mais adiante. 

Na prática, as observações feitas por essas instituições tendem a discorrer sobre mudanças recentes, ainda que sinalizem que estejam olhando para o futuro.

Unindo esse aspecto ao ponto comentado anteriormente, temos que de fato esse apontamento não indica que teremos forte fluxo de capital estrangeiro para o Brasil nesse momento, mas sim que houve com esse relatório uma confirmação do que o investidor externo tem visto em relação ao Brasil nos últimos tempos – e por quais motivos têm aportado capital em função disso.

Pode parecer uma diferença sutil, mas realmente importa ser apontada para que não se crie, com base em relatórios que olham o retrovisor, previsões mirabolantes sobre o que se aproxima no pára-brisa.

Não significa endosso a descontrole fiscal

Esse aspecto talvez seja um tanto trivial caso você esteja no mercado financeiro, mas não será assim em relação às mentes mais heterodoxamente criativas que estão no governo nos dias atuais. 

E a explicação envolve duas partes.

A primeira parte é levar em conta que, sim, como apontado por Roberto Campos Neto recentemente, com um arcabouço fiscal que pelo menos sinaliza que o governo não poderá gastar sem quaisquer restrições, o risco de cauda do lado fiscal realmente some do mapa. Podemos ter sim decisões equivocadas em termos de alocação de recursos, mas elas não nos transformarão em uma Argentina ou qualquer coisa do tipo.

Já a segunda é um pouco mais específica: o apontamento do relatório da S&P está sobre medidas tomadas já em Lula III que apontam para uma reversão do afrouxamento fiscal dado à passos largos da PEC dos Precatórios em diante, mas definitivamente não corroboram a visão que alguns analistas poderão ter de que “foi só entrar o Lula novamente que os bons ventos voltaram a soprar” e, portanto, “faltava apenas retomar planos que muitos disseram que foram um fracasso no passado”.

Esse segundo aspecto tem um potencial razoável de causar dor de cabeça nos próximos períodos, porque embora o crescimento surpresa verificado recentemente seja muito mais relacionado ao agronegócio do que aos setores de serviços e indústria (que aliás, não vão tão bem assim), possivelmente deixará nas mentes mais criativas da economia brasileira a ideia de que “precisamos acelerar a marcha das ideias que tanto criticaram, mas que agora trazem crescimento notável de novo”.

Não significa “acabou o trabalho”

Estamos todos na mesma página quando falamos sobre o risco de cauda do fiscal ter saído do mapa com o novo arcabouço fiscal (ainda não aprovado, mas com altíssimas chances de o ser). 

Porém, questões diretamente relacionadas ao tamanho do Estado e também à eficiência e produtividade econômicas tanto pública quanto privada seguem na mesa.

Uma safra extraordinariamente positiva e uma balança comercial que tem surpreendido até os mais otimistas são dois aspectos intimamente ligados e que não necessariamente significam uma sustentável continuidade. Ou, em termos bem diretos: não podemos contar com crescimento e receita adicionais do que surpreende o tempo todo, outras questões urgentes precisam ser abordadas.

Reforma tributária, ainda que em estágio atual de carta de intenções, de fato pode ser aprovada, o foco anunciado pelas equipes econômica e de articulação política é exatamente esse. 

Diante de um cenário mais positivo do que o esperado, a criatividade de botar em prática ideias fracassadas misturada com a clássica ideia de não dar notícias ruins enquanto tudo parece muito bem – ou seja, deixar de lado prioridades realmente relevantes -, não podemos negar que, em se tratando de governos brasileiros, somos especialistas em “desandar o caldo”.

Perspectiva positiva anima os mercados e faz com que nos lembremos que somos mesmo o eterno aluno nota seis que não repete de ano. Só não podemos confundir esse mesmo aluno com aquele que surpreende com aprovações nos mais difíceis vestibulares logo em seguida. Muita calma com o andor, que o santo é de barro!

[IN-CONTENT] ABRA SUA CONTA [NOVO] - NORMAL - END
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